26/01/2017

Maquinário de personalidade

2007 - Foto de Aristóteles Alves Ferreira  (Flickr/Reprodução)

Terminal Barra Funda. Quatro linhas de trilho unidas numa única estação. Confusão para chegar, confusão para sair. Ele levava consigo uma mochila aparentemente leve e o boné indicando que o cabelo não estava em um dia muito bom. Uma máquina automática indicava o ponto em que precisava seguir outro caminho. Cabeça baixa, passos rápidos, resolveu levantar os olhos, contemplar a máquina. O homem e a máquina. De dentro do considerável vidro do objeto, haviam livros, exemplares de preços, temas e tamanhos diferentes. Admirou a beleza sublime dos papéis por um momento, mas já tinha um eleito.

Um chiado de trem estacionando e quase desistiu do dito cujo, mas voltou em seguida, não era seu caminho ainda. A animação de dar a nota para alimentar a máquina era sempre diferente, já que o fruto nem sempre era igual. Digitou uns botões, esperou ansioso o acionamento da máquina, segundos interessantíssimos de se ver passar. O livro caiu, feliz por sair dali. A queda livre, rumo ao mundo lá fora, foi interrompida bruscamente: emperrou no fim do túnel. A máquina não o deixará ir. Permanecia preso entre o metal argolado que prendia os outros livros e o vidro já velho amigo.

A emoção da espera foi substituída pela decepção da perda iminente. Chutou, esmurrou. A máquina permanecia impassível. Virou as costas, haveria outro dia de glória, nesse já estava derrotado. "Balança ela, filho!", um senhor da loja ao lado gritou contente. Pegou ânimo e retomou a batalha. Balançou a máquina, balançou a si próprio, mas o livro não se movera. O senhor voltou com uma régua na mão, animado com toda aquela cena nova. Um grupinho também aguardava ansioso o desfecho daquele confronto. Homem e máquina.

Com a régua - e muito contorcionismo -, se abaixou em frente à porta de saída da máquina, pôs a mão lá dentro e, com o auxílio da régua, o livro enfim pôde ter sua liberdade. O velho aplaudiu, gostou do resultado. O grupo ao redor se dispersou, não havia mais no que focar a atenção, voltaram a suas rotinas, aos caminhos que deviam seguir. Homens maquinizados.

Acredito que alguém que sirva de inspiração a quem escreve merece destaque, e por isso, esse texto é dedicado a Renan Guerreiro, meu parceiro da faculdade e da vida. Amo os escritos dele e sem sua presença com certeza a vida acadêmica não seria tão divertida. Obrigado por ter passado por esse transtorno homem versus máquina e ter me contado.

7 comentários:

  1. Que crônica boa, Selma! Imaginei logo uma estação de metrô de SP, fui lá só uma vez mas guardei a imagem na minha memória e já quero voltar pra lá esse ano, hahaha!

    Beijos!
    www.likeparadise.com.br

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  2. Deu saudade de São Paulo, morei lá pouquinho tempo, mas já guardei no peito! Aqui é tudo tão calmaria que dá vontade de viver mais uns dias no caos do movimento de lá! Bela crônica! ♥

    www.FLOREJAR.com

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  3. Nossa, que incrível. Quem escreve relata com suas palavras algo que pra quem vive o que se é relatado, não tem nada lá muito especial. Graças a você esse momento não passou em branco. Adorei. Bjinhos <3

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  4. Menina, que texto maravilhoso, amei a leveza e os detalhes da sua escrita. Sou apaixonada por histórias assim, onde eu posso imaginar o cenário sabe?! Nunca pare de escrever, tu literalmente tem o dom. Até te indico a procurar uma editora, tem umas que sempre ajudam as blogueiras com boa escrita.

    Beijos e to seguindo esse cantinho <3

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  5. Nossa, eu amei, parece um conto que eu leria num livro, muito bem escrito, pude imaginar todas as cenas <3

    bruna-morgan.blogspot.com

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  6. Acho que nunca vim aqui, mas gostei e já estou seguindo!
    Parabéns pela escrita, muuuito boa!

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Um beijão, Selma Barbosa.