Acredite em sua sorte

Samantha adorava quando as reuniões da empresa eram feitas naquele restaurante chinês na zona sul da cidade. A comida era ótima, o ambiente tranquilo e ela estava próxima de sua casa. Quase sempre não focava nos assuntos discutidos e ficava sorridente quando o chefe comprava biscoitos da sorte para toda a esquipe. Bom mesmo é que o biscoito significava também o fim da reunião.

Passava das 21 horas quando ela ganhou seu biscoito. Abriu-o e não sabia como reagir diante da mensagem. Guardou no bolso do casaco antes que Carlos viesse sorrateiro ver o que estava escrito. "O que você tirou?", ele perguntou com sorriso claramente bêbado. Samantha inventou qualquer coisa que leu no horóscopo enquanto, com a mão ainda dentro do bolso, pressionava o papel contra a própria pele. O sorriso fingido, a cara de quem estava entendendo os números produzidos na empresa na última semana já tinham se desfeito. Só queria a calma de sua casa.

Parada no sinal vermelho, ela abriu o porta-luvas do carro e releu a mensagem escrita no papel pequeno: "Sua vida está em perigo, não diga nada a ninguém. Você deve sair da cidade imediatamente e nunca mais voltar". Mesmo acreditando se tratar de alguma piadinha ou jogada de marketing do restaurante, ela acabou ficando com o pé atrás. Quando viu a placa de retorno para a interestadual segurou forte no volante, desejosa de seguir aquele caminho. Mas deixaria tudo por um pedaço de papel? Afrouxou as mãos do volante e seguiu adiante. Na pequena elevação da rua sorriu leve, ao ver que surgia sua casa simples, que parecia saída de um filme noir.

Jogou a bolsa no sofá e contemplou os segundos relaxantes de tirar os saltos e sentir o carpete macio sob os pés. Assim que o celular conectou no Wi-fi, uma notificação foi recebida indicando um novo e-mail na caixa de entrada. De um remetente desconhecido, a mensagem dizia "Sorria para a câmera". Com o coração acelerado, ela perscrutou com olhos apressados toda a sala e os outros cômodos adjacentes. Até encontrá-la ao lado direito do computador em seu quarto. Pequena, quase camuflada na bagunça cotidiana, uma webcam ligada, filmando-a. Samantha nunca comprara uma webcam.

Desesperada, jogou o aparelho no chão até ter certeza que não funcionava. No celular, uma nova notificação. "Acredite em sua sorte", dizia o e-mail recebido agora. A chave do carro ainda estava no bolso, os documentos precisariam ser retirados da bolsa jogada no sofá. Na corrida que deu até a sala, lembrou-se do celular esquecido no quarto. Um ruído ritmado, separado por intervalos regulares chamou sua atenção. Abriu o guarda-roupa e então viu do que se tratava. Um objeto minúsculo mostrava números numa luz vermelha. Um cronômetro em contagem regressiva já mostrava o número dez. Chegou a porta, rodou várias vezes sem resultado. Ainda sobrou-lhe tempo para pensar. Acredite em sua sorte. Não poderia aproveitar esse conselho na vida. 3, 2, 1. E então veio a explosão.